segunda-feira, 20 de abril de 2020

Crônicas da cidade pandêmica: O professor e Sísifo

iStock/Getty)

De segunda a sexta, eu tenho uma rotina. Acordo mais ou menos às sete horas da manhã (às vezes às 06:30), vou tomar café, organizo meu computador em cima da mesa da sala e começo a trabalhar dando aula. Sou professor de Inglês, é como eu ganho o famoso "pão de cada dia" aqui na cidade de São Paulo. Tenho uma grande sorte: porque sou professor de alunos adultos, e em sua maioria pessoas trabalhando em grandes empresas, existe uma certa cultura já incutida neles de usar o computador para chamadas virtuais. São um grupo que tem em si o costume de reuniões via Skype ou Zoom, e que por serem adultos, carregam a responsabilidade de comparecer e se esforçar em casa para avançarem na compreensão da língua inglesa.

Infelizmente,o mesmo não se pode dizer de meus colegas professores regulares, trabalhando em condições terríveis neste momento pandêmico. A profissão, verdade seja dita, nunca foi respeitada devidamente; quando não é considerada coisa de vagabundos reclamões (pelo Estado, quando buscamos nossos direitos), é endeusada como "vocação", igualando-nos a padres e certamente visando nisso o voto de pobreza dos mesmos, já que assim podem justificar para si mesmos  sem sentirem-se culpados, o porquê do salário de fome com o qual muitos professores tem de sobreviver.

Junte-se a isso, neste momento,um momento de crise na sociedade em geral, pais desesperados para que a escola tome o papel deles como educadores  para seus filhos quarentenados em casa (sendo que esse processo deveria ser uma parceria), e uma direção escolar que teme mais do que nunca perder clientes, e temos a completa recieta pro desastre. E como sempre, a carga disso tudo cai em cima dos professores regulares. São eles os que tem de fazer os alunos produzirem, são eles os responsáveis pelo sucesso ou fracasso desta empreitada em um momento que ninguém viveu antes, que ninguém sequer imaginou que iria viver.

A cada dia que trabalham os professores sofrem mais uma pressão, sem saber se perderão aulas (e portanto, dinheiro). sem saber qual a próxima problemática que será criada. "Como todos nós!", o mais cínico diria,e  ele estaria certo: como todos nós, os professores sofrem igualmente. Então por que diminuir seus esforços? Por que dizer que eles estão em melhores condições que outros trabalhadores, forçados a um home office que na verdade os suga 24 horas por dia?  Por que exigir dos professores o preparo que sabe-se que NINGUÉM teve para esses tempos?

A resposta para isso tudo é simples: falta de empatia. O mundo pandêmico surgiu, e revelou o quanto há pessoas que simplesmente observam seu próprio umbigo e se recusam a entender o sofrimento de outros, o esforço que se faz para manter um resquício de ordem e normalidade em nossos dias turbulentos. Querem tudo como antes, querem resultados sem arregaçar suas próprias mangas. Bem, isso não vai acontecer. Para sobrevivermos, precisamos todos trabalhar juntos, de mão metafórica dada. Ou vivemos e trabalhamos juntos, ou morreremos sozinhos e sufocados.




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