segunda-feira, 25 de abril de 2022

Crônicas do Ano do Tigre: Tempos e tempos verdes


Napoleão, quando invadiu o Egito, teria dito aos seus soldados "Do alto destas pirâmides, 40 séculos vos contemplam". Eis algo que um conquistador clássico diria, posto que é antes de tudo um romântico; afinal, para se sonhar dominar toda a Europa, você tem que ser ou um pouco maligno, ou um pouco romântico, possivelmente um pouco dos dois. 

A verdade é que, antes de qualquer apreço pela história, Napoleão estava embasbacado com o sublime de se ver construções tão antigas, e deve ser algo que realmente assombra a mente. Não sei dizer, não estive no Egito ainda; Mas posso dizer que uma emoção similar sempre me passa quando observo, andando pelas ruas de Sampa, as nossas estrondosas árvores, que existem sim, apesar da fama de cidade cinza que temos. 

E talvez por serem tão raras assim, eu me sinta abismado quando as vejo: tão fortes, em terreno tão hostil. E gigantes, algumas, nos lugares mais inusitados: aqui mesmo, em pleno Rio Pequeno, próximo a um lugar singelamente chamado de "Riacho Podre", há uma árvore tão bela que não pude me conter e tirar uma foto, que ilustra o começo desta crônica. "Maria Moura", eu a chamei, por ser tão forte e majestosa em meio a um terreno tão hostil. 

E assim sigo passeando pelas ruas de Sampa, observando estas construções majestosas da natureza, se é que posso assim dizer. Passo por elas caminhando, de ônibus, dirigindo às vezes; e sempre que as vejo, penso em como elas parecem acenar silenciosamente, para mim e todos que andam nas ruas, como testemunhas silenciosas de anos e anos de vida humana na terra, rumando para o nada, a troco de algo que pensamos valer a pena. 




domingo, 3 de abril de 2022

Crônicas do Ano do Tigre: Ghosts of São Paulo





 E entre tapas de atores, escândalos previsíveis e aumentos de valores da gasolina, o que mais me chamou atenção esses dias foi um post do facebook. 

Era um relato de uma amiga minha, falando de seu costume estranho, quando chegou em São Paulo, de ir ao aeroporto e observar as pessoas chegarem e partirem, quase como que uma versão de vida real daquele programa da Astrid Fontenelle na GNT. No post, ela contava o quanto gostava de ver as emoções acontecendo ali, in loco, e em como se sentia um fantasma, vendo de longe emoções que não lhe pertenciam. 

Eu não respondi no texto dela, mas digo aqui: querida amiga, somos dois, somos 3, somos milhares, perdidos em São Paulo, vivendo nossas vidas de fantasmas. Alguns de nós tem a pena comutada bem cedo; eu mesmo só fiquei como assombração nesta cidade grande por um ano, até poder me encontrar e estar com pessoas que são minha família aqui agora. Mas também eu fiquei vagando por aí, coletando emoções em cada esquina, levando para casa como uma tampinha de refrigerante para colecionar. 

Nós, os fantasmas, nunca andamos em conjunto, porque de alguma forma isso nos faria sentir ainda mais solitários; mas conseguimos reconhecer bem um ao outro. Lembro de andar pelas ruas do Butantã e observar os bares e festas acontecendo ao redor, e algumas vezes eu entrava em algum boteco, pedia uma cereja, e ficava ali pensando, humildemente pensando na vida, e nos meus erros. Sempre, em algum momento, eu veria uma outra pessoa com a mesma postura que eu, o mesmo olhar perdido, pensando... em que? A cidade de onde saiu? Os lugares que gostaria de ver? Quem pode saber? 

Principalmente agora, quando o frio caiu pela cidade, eu penso no fantasma que fui, e nos que andam ainda por aí, assombrando a si mesmos enquanto andam pelas ruas. Alguns sem casa para se refugiar, alguns com casa, mas sem lar.Eternamente vagando pelas trevas de suas mentes solitárias.