domingo, 2 de maio de 2021

Crônicas do Novo Normal: Uma marca no mundo



Na minha família, temos muitos escritores e amantes de literatura em geral. Minha mãe e meu pai são escritores publicados; minha esposa é com certeza a maior conhecedora de literatura latino-americana que eu tenho o prazer de poder ouvir; eu mesmo sou um projeto de escritor aqui, com estes rabiscos que ouso chamar de crônica.... enfim, todos temos um amor pelas letras, e pelo que elas podem fazer-nos sentir e pensar, ainda mais nestes "tempos cinzas", como minha mãe chama. 

Falo disso para contextualizar nossa conversa de hoje (sempre falamos um com o outro aos fins de semana, via ligação de vídeo): meus pais e nós aqui em casa falávamos de contos e crônicas que gostamos de escrever e ler, e ao mesmo tempo falávamos das peripécias que nosso animaizinhos fazem, gatos e cães. Minha mãe, que já tem um livro infantil falando de um de nossos pets (Memórias de 4 patas é o nome da obra, a propósito). disse o seguinte então, a respeito disso: 

- É bom a gente escrever isso, né, essas coisas que acontecem dos nosso bichinhos e da gente. Porque fica de memória, sabe, fica de lembrança de como eles eram, de como eram as coisas....

A conversa depois seguiu para outros pontos, mas não pude deixar de ficar pensando nisso, no peso que isso carrega, talvez mais do que a pessoa que proferiu a frase tenha sequer percebido. nesse momento, lá fora, existe uma pessoa que faz algo, e seu filho vai lembrar pro resto da vida. Um gesto, uma canção, uma forma de cortar o pão: marcados, por resto da vida. E essas coisas somem, com o tempo, as preocupações, a morte. 

Se os animaizinhos, que tanto nos encantam a vida, merecem ter sua vida registrada, por que não as pessoas? Acho que até mais, dado o impacto ser nitidamente maior. E talvez o registro não precise ser escrito: a marca de uma vida bem vivida pode ser um filho/filha que cresceu e seguiu no mundo, sendo bom, deixando coisas boas. Ou um parque construído para as crianças brincarem, como no filme de Kurosawa Viver. Ou uma coisa ainda mais singela, uma lembrança que causamos em alguém, aleatório, na rua, e que faça a pessoa sorrir num momento bobo desse, que nos sentimos satisfeitos sem saber por que. 

A vida é feita desses momentos pequenos. Às vezes esperamos as coisas grandes acontecerem, para podermos enfim levantarmos e dizer "Por Deus, que felicidade sinto!". E não é assim. Felicidade é o quebra-cabeça mais complexo que temos; quisera eu que todos nós conseguíssemos montá-lo!

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