segunda-feira, 24 de agosto de 2020

Crônicas da Cidade Pandêmica: A marca de uma lágrima

The cry, por Kelly Mills.


O valor do choro é algo inestimável, e no entanto tantas pessoas julgam-no algo pobre, algo pouco. Por muito tempo, chorar era algo como que um sinal de fraqueza: "menino, engole esse choro! Homem não chora!" "Agora não adianta chorar!" etc. Principalmente entre os homens, chorar era quase assim, como que um ato falho imperdoável: então você chora por qualquer coisa? Que fracote! Que maricas, diriam os outros, usando esse xingamento tão chulo quanto sem sentido. 

Sim, o choro foi igualado, por muito tempo, a uma fraqueza de espírito, que por sua vez era igualado a uma fraqueza decididamente feminina, no velho pensamento que a mulher é por natureza fraca, e o homem é por natureza forte e invulnerável à emoções. Como se isso fosse possível, ser impermeável à emoções. Não são elas, afinal, que nos tornam humanos?  Ou talvez seja isso que deseja-se dos homens: que eles sejam acima da humanidade. Uma luta vã, é claro. 

Quisera eu dizer que estas ideias são coisas do passado, mas acontecimentos recentes me impedem de poder fazê-lo. E quisera também poder dizer que é um caso isolado do nosso país: ao que parece, todos os podres poderes se reuniram para retornar com tudo, e eu não sei dizer quando eles vão embora. Algumas pessoas, mais otimistas, dizem que é só o último respiro de um mundo antigo, antes do nascer do novo. Essas pessoas claramente não conhecem a História. O Passado sempre volta. A perseguição ao que é considerado fraqueza, portanto, sempre voltará: os sofrimentos sempre sendo empurrados ao fundo do peito, até tornarem-se um câncer devorando tudo por dentro.

Por isso, urge que não esqueçamos as pequenas coisas que podemos aprender de tantos ciclos passados de dor, e que possamos iniciar um novo momento, após esta pandemia, onde mudemos uma pequena coisa que seja, um míinimo elemento. Que sejamos mais fieis ao que sentimos, e não no sentido que todo adolescente diz ser. Que choremos quando a dor apertar o fundo da alma. Que assim aprendamos o valor dos momentos felizes. 








4 comentários:

  1. Bela crônica. Infelizmente não creio que o homem mude pra melhor pós pandemia. Todos nascemos chorando,independente do gênero. É no ato de expor seus sentimentos que se distingue o homem do macho.

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  2. Fé no que pode vir. Ou não. De repente a humanidade nos surpreende. Mas não creio nisso.

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  3. Fé no que pode vir. Ou não. De repente a humanidade nos surpreende. Mas não creio nisso.

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