Sou afortunado por estar em quarentena com uma mulher que é minha parceira de vida, com quem divido minhas dores e os absurdos cada vez mais frequentes da vida. Nosso dia-a-dia, diferente de tantos que tenho ouvido falar, a bem da verdade não se alterou muito, pelo menos no que se refere à nossa vida caseira. Vemos séries juntos, ou filmes; conversamos e rimos de algum assunto que esteja no ar; lemos juntos sentados no velho e bom sofá preto de 3 lugares, presente de minha querida sogra.
É claro que não é exatamente como antes do Covid-19. Cada uma dessas ações é temperada pela ansiedade e medo, ainda mais quando se aproximam o anoitecer e a hora da notícias cinzas: nesses momentos o tom que adotamos é sóbrio e talvez um tanto fúnebre. É difícil manter a leveza com tantas coisas acontecendo ao mesmo tempo, e o stress dessa sobrecarga já se fez sentir mais de uma vez aqui em casa. A intoxicação pelo excesso de notícias péssimas é uma realidade que já existia antes da pandemia, e que só fez se agravar agora.
Enfrentado de maneira solitária, isso poderia ser um destruidor mental, mas tudo é muito melhor suportado porque temos um ao outro em meio ao caos deste mundo, e no colo de cada um encontramos nossa fortaleza. Mas e os que não tem essa sorte? Entre meus amigos virtuais, vejo uma reclamação constante de solidão. Alguns lamentam a distância da Pessoa Especial de suas vidas, muitas vezes milhas e milhas distantes, parafraseando Evandro Mesquita; outros queixam-se que a quarentena os impossibilita até de buscarem um alguém nestes momentos de distanciamento social. É o amor nos tempos da praga: onde antes o físico reinava supremo, agora vence o etéreo. As pessoas estão tendo de (re)aprender a arte do encantar pelas palavras, como nos tempos das juras de afeto além-mar, das mensagens vindas do front de guerra longínquo.
É claro que, como naqueles tempos, há uma certa dose de hipocrisia em alguns casos: da mesma forma que alguém entrega seu corpo ao prazer de mais dois ou três que pensam ser o único, este mesmo alguém despeja seu falso lirismo em duas ou três cartas, trocando uma leviandade física por outra mais espiritual - talvez até mais séria que a falta anterior, se pensarmos bem.
Mas e os sinceros, o que buscam um único elo neste momento? A estes, resta reconectarem-se com a fina arte das cartas de afeto e amor, se quiserem algo mais concreto que uma foto nua - que tem seus divertimentos, mas pouco uso em preencher o vazio interno de um indivíduo. Já com as palavras certas... quanta diferença! Em cada frase, um pedaço de uma ponte em direção ao coração do ser desejado/amado. Que importa se a distância existe, se o encontro ao vivo, num futuro lá longe, trair todas as expectativas criadas nos tempos do isolamento? Neste momento, duas pessoas conseguem se conectar e ajudar uma a outra a acreditar mais em algo. E isso pode fazer toda a diferença.
Discord reaproximando os amigos
ResponderExcluirDiscord e outros né não? Tempos de elos virtuais....
ExcluirEXCELENTE é o adjetivo que aplico a está crônica que vai tão fundo à ALMA.
ResponderExcluirAssim como você cita no início, em casa não mudou muita coisa: só estamos mais tempo juntas em casa,as fazendo o que já fazíamos 🤓. Que bom termos quem amamos por perto😉
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