Veio uma frente fria essa semana, de sorte que passamos muito tempo com as janelas fechadas aqui no bom e velho apartamento. Por sorte, o fim de semana deu uma esquentada, então pude ficar um pouco na sacada daqui, que acaba dando vista para a avenida Rio Pequeno. De onde estou, consigo ver lojas antigas, bem antigas; em um grupo que faço parte do facebook com fotos históricas da Zona Oeste de Sampa, vi que elas tem quase uns 15, 20 anos. Me pergunto se os donos são os mesmos, se passou de geração em geração a responsabilidade de levar o negócio adiante. Me pergunto como é a cabeça da pessoa que toma conta agora, comparada com a que abriu o estabelecimento.
Às vezes, me pego pensando nisso mesmo, em como seria uma vida nos anos 60, 70, 80. Na verdade, esta é uma frase equivocada: não penso tanto em como era factualmente a vida naqueles dias, mas sim no mundo interno das pessoas que vieram naqueles anos, no Brasil e no mundo. É muito fácil pensar que podemos entender como eles racionavam, afinal, nossa mente não se alterou em nada, biologicamente falando, daqueles dias para cá. Mas no quesito interno, imaterial, por Deus, quanta diferença temos de nossos pais e avós!
Por exemplo, as referências culturais; gostamos de pensar que temos total entendimento do que as pessoas gostavam de assistir, ouvir, ler no passado, porque temos dados e tabelas num gráfico e podemos inferir, digamos, que se a música X era a mais ouvida, com certeza era ela a unanimidade entre todos, amada universalmente. Essa generalização nos impede de ver as nuances - que são a coisa mais interessante numa sociedade. Para cada fã de Roberto Carlos, tem um fã de Ovelha; para cada aficionado por rock, há outro fanático por Bossa Nova, e assim por diante. Os gostos são diversos em todos os tempos.
As referências ao redor, é claro, também mudam muito. Basta ver uma entrevista ou filme antigo e ver referências a coisas como uma série chamada "Duro na Queda", ou algum jogador de futebol que era o afã da época e hoje é pouco ou nada lembrado. Suponho que os símbolos vão mudando para cada geração; e embora alguns destes sejam fortes o suficiente para chegar até os nossos dias, muitos se perdem no caminho, cápsulas do tempo culturais prontas para serem desenterradas algum dia.
Com tudo isso, fico pensando no que a nossa geração de agora, a nossa sociedade, vai deixar como mensagem para as outras que virão. Porque outras virão, pode estar certo: o pensamento que tudo vai acabar em breve é tão tolo quanto pueril, sem contar um pouco egocêntrico, de certa forma. Sendo assim, o que será que temos de hoje que vai ser tão impactante assim, ao ponto de ter seu significado mantido razoavelmente intacto lá na frente? Será nossa imagem uma de resistência ou de ódio e horror? Qual será o julgamento da História e nosso suor e lágrimas?
Olho para a rua deserta pensando nisso, profundamente, e lá longe os fantasmas disfarçados de vento continuam a soprar e dançar sua dança eterna, avenida abaixo.
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