Hoje foi o aniversário do meu afilhado-sobrinho, e cantamos os parabéns pela internet. Foi um momento alegre, tecnológico e confuso, porque todos nós acabávamos falando ao mesmo tempo, e o som saia um pouco atrasado lá na casa do jovem Bernardinho, no alto de seus dois anos de idade. A culminância foi, é claro, cantarmos os parabéns cada um em um ritmo cacofônico mas cheio de amor ao pequeno Bê, que parecia interessadíssimo no seu bolo bem à sua frente.
Isso tudo foi, obviamente, um momento feliz, e que convidava a participar ali, no presente. Mas a cabeça de certas pessoas nunca para de pensar em uma miríade de coisas, e a minha é assim também. Pois enquanto eu batia palmas e desejava felicidades àquela criança, não pude deixar de pensar no mundo que vinha ao encontro dele, mais cedo ou mais tarde. Que mundo é esse, eu pensei. Que coisas virão até ele, até meus outros sobrinhos, até meus futuros filhos.
Porque veja, muito se fala do "novo normal". Raios, o título geral destas crônicas é exatamente uma referência a isso, a esse novo mundo que surge no momento durante e após a pandemia, aonde teremos de nos acostumar com uma série de coisas novas, nem todas boas. Falamos isso, mas eu não creio que tenhamos exatamente pensado como seria, como será, esse novo jogo que jogaremos, dados na mão, tensos com o que a sorte nos trará.
Na verdade, eu acho que as pessoas ainda se apegam a que as coisas vão voltar a ser exatamente como eram antes. As mesmas relações sociais, as mesmas despreocupações andando nas ruas. Que quando tudo isso acabar, vamos simplesmente andar nas ruas sorrindo, lambendo postes e comendo comidas da rua sem nenhuma preocupação com vírus e afins.
Já eu, acredito que mesmo os que estão neste momento despreocupados fazendo festas com aglomerações e bingos clandestinos nas caladas da noite de Sampa e sem pensar no amanhã, irão entender que este mundo de antes, de 2019 pra trás, está irrevogavelmente mudado. Muitas pessoas morreram para que ele pudesse continuar o mesmo, é impossível que tanto horror tenha ocorrido e nada se altere. A fábrica delicada da sociedade que acreditava no governo, na bondade geral da sociedade em momentos de necessidade, ou mesmo na invencibilidade da nossa tecnologia contra algo tão supostamente simples quanto um vírus, está completamente alterada.
Há muito que já tínhamos perdido as esperanças em um futuro melhor, mas creio que ainda havia pelo menos a visão de algo igual, sem mudanças; isso se foi agora. Resta a nós, que temos mais agência que bebês como meus sobrinhos e tantos outros filhos da quarentena e pandemia, nos mexermos e alcançarmos um ponto mínimo de sanidade para eles e para outros que virão.
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