Sexta-feira passada morreu mais um habitante das ruas. Morreu no Rio de Janeiro, dentro de uma padaria, pedindo por ajuda, o que nesse país é um crime grave: ninguém quer ser incomodado com pedidos de ajuda nas ruas. Todos querem somente ir para casa e se entocar em seus paraísos artificiais, longe da multidão. E é tão fácil seguir assim, não? Afinal, não é minha a responsabilidade, nem sua. Certamente, quem falhou com essa pessoa foi o Estado! Que o Estado venha e tire esse farrapo humano de perto de mim.
E assim foi com Carlos Eduardo, que morreu entrando na padaria que sempre chegava e pedia pelo amor de Deus, que lhe pagassem um café ou lanche ou algo assim. Que naquele dia não queria comida: queria ajuda, que chamassem o SAMU, por favor. Que tinha dois cachorros, suas companhias fieis, doadas um pouco antes dele morrer, porque estava sentindo que sua saúde estava afetada pela tuberculose que lhe fustigava. E que morreu e foi coberto por dois sacos pretos, perto da geladeira da padaria, a qual seguiu funcionando normalmente: Não podemos parar, que é isso? Só por que um ser humano morreu? E eles lá são coveiros, deve ter pensando o dono, imitando uma vergonha federal nossa.
A história é triste, e se repete. Não faz nem 4 meses, um trabalhador morreu no Carrefour, e tudo que a loja fez foi cobri-lo com guarda-sóis, fechar a área do corpo, e seguir o trabalho normal. A economia não pode parar, não é o que dizem? E , pelo jeito, a vida no Brasil é isso: consumo e venda, mortes são mortes. De fato, as mortes são tantas e tão comuns, que fazer piada com elas virou um lugar comum, ao ponto de uma churrascaria fazer troça da morte de Eliza Samúdio e Isabella Nardoni. Sem pudor, só pelo marketing. Estes são os signifcados das mortes no Brasil: piadas e marketing.
Que se pode fazer? Muito, na verdade: mas podemos pelo menos começar a recuperar a nossa alma da podridão que nela se instaurou.
Porque, amigos, como se pode ver pessoas morrendo e só seguir adiante? Falamos aqui de duas pessoas, mas e todas as mortes nas favelas e baixadas da cidade, quando as pessoas muitas vezes tem de simplesmente desviar do cadáver e seguir em frente. E dizemos: mas sempre foi assim, e sempre será. Mas não, nem sempre foi assim. E não tem que ser assim para sempre. Não quero crer que estamos tão anestesiados que as mortes são só corriqueiras em nossas vidas. Por favor, que voltemos a ser humanos.
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